Quem tem por volta de 30/35 anos - ou menos - não tem idéia do impacto causado pela invenção do termômetro de peru. Ou do peru com termômetro, como queiram. Trata-se daquele dispositivo de plástico vermelho, enfiado na carne da ave, que indica o momento em que a dita cuja pode ser retirada do forno: o "apito", como se costumava dizer (ainda que tal dispositivo não emita nenhum som. A emissão de som por um peru acabaria de vez com qualquer resquício de sobriedade que se deseja numa ceia de Natal).
Mas, crianças, acreditem: os perus não nascem com aquele, vá lá, "apito". O tal objeto é colocado nas aves que passam por um processo industrial, que também inclui a adição de temperos. Tudo para acabar com o drama que tornava ainda mais tensos os dias que antecediam o Natal. Até onde me lembro, não havia, na vila dos meus avós, em Piedade, uma espécie de perucídio natalino. Os perus não eram mortos ali. Lá pelo início da segunda quinzena de dezembro, as donas-de-casa iam ao aviário (ficava na avenida Suburbana, creio) para escolher o seu peru. "É aquele ali, aquele gordinho." No dia 23, ou no próprio dia 24, o peru era morto e entregue à dona, que o levava para a padaria, onde ele seria assado. Entenderam? Perus eram assados na padaria, não nas casas. Não sei se os perus da época eram maiores, se não cabiam nos fornos domésticos, se exigiam mais calor, se consumiam boa parte do gás armazenado nos botijões domésticos. Mas lembro que era difícil determinar o ponto exato em que o peru ficaria pronto. Nas poucas casas que assavam seu próprio peru eram formadas juntas de especialistas, vizinhas eram chamadas a opinar. Dava muito trabalho cuidar do peru natalino, daí a opção pelo forno da padaria.
Foi assim até meados da década de 70, quando uma empresa - a Sadia, creio - inventou o peru temperado e com o tal do apito. Claro que o apito - um negócio que pulava do peru e que, ainda por cima, era vermelho - fez nascer uma nova geração de piadas em torno das acepções da palavra "peru". Piadas que eram repetidas a exaustão e que ganhavam novo fôlego a cada rodada de "Sangue de boi" ou de champanhe (sim, champanhe, champanhe nacional, espumante é termo etilicamente correto do qual nunca tínhamos ouvido falar) George Albert ou Peterlongo.
Não, esqueçam: não há a menor chance de encerrar esta crônica com uma frase de caráter nostálgico que apóie a simplificação do ritual do preparo do peru e que denote algum tipo de saudade da poesia dos perus de outrora. Que mané saudade de peru! Eu, hein.
22 de dezembro de 2007
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