Será que nos cansamos do Brasil? Dia desses, conversando com o Antônio Torres sobre as, de um modo geral, baixas vendagens de livros brasileiros de ficção, ele, meio irritado com ôba-ôba em torno de Cabul, disse algo bem interessante: o Brasil estaria deixando de ocupar o imaginário dos brasileiros. Ou seja, estaríamos pouco dispostos a sonhar com o que nos cerca. Seríamos assim capazes de nos transportamos para a Turquia, para a Índia, para o Afeganistão, para outros territórios remotos que escondem segredos guardados por gente de nome esquisito. Mas estaríamos meio refratários à idéia de compartilhar dramas, sonhos e desejos com Josés, Marias, e, numa concessão aos novos tempos, Dayannes e Jeffersons. É um fenômeno curioso, já que livros sobre aspectos da história do país se revezam nas listas de mais vendidos.
Nos últimos 50 anos, o Brasil passou por vários momentos de “agora vai”: governos JK e Jango, o tal do milagre brasileiro forjado na ditadura, a luta contra a própria ditadura, a expectativa pelos dias melhores que viriam com a redemocratização, as eleições para governadores, as diretas já, a constituinte, a eleição do presidente, os governos FHC e Lula. Alguma coisa disso teria que ter dado certo, né? Mesmo durante a ditadura havia a perspectiva de uma grande melhora do país, sonhávamos com isso, acreditávamos nisso. E talvez isso nos fizesse mais interessados no Brasil, nos seus destinos, nos seus escritores, nos universos que eles criavam. Livros de autores como Rubem Fonseca, Ignácio de Loyola Brandão, Márcio Souza, Antonio Callado e Antônio Torres eram de leitura quase obrigatória - lançado em 1976, o “Essa terra”, do Torres, vendeu muito logo de cara, está na 15ª edição! Será que chegaria a tanto se fosse publicado hoje?
De certa forma, dava gosto sonhar com o Brasil. Hoje, sei não. O país melhorou, claro, mas muito menos do que imaginávamos. Quase no fim na da primeira década do século 21 ainda discutimos questões básicas, como ensino público de qualidade. Ficamos meio naquela história medíocre da “utopia possível” sintetizada pelo FHC – que, tempos depois, diria que “o Brasil é isso mesmo”. Isso justifica até mesmo a transformação do PT num grande PMDB. O que que isso tem a ver com literatura? Pode ter a ver. Cansado de esperar o tal dia que nunca chega, o leitor pode ter decidido sonhar com mundos mais interessantes e fascinantes, e tome Cabul. E aí é que nos ferramos, autores ou não. As pessoas, mais do que pouco interessadas na literatura brasileira, estariam desinteressadas do Brasil, não necessariamente do país real, palpável, mas daquele que as poderia encantar.
Em tempo: segundo a Ilustrada deste domingo, “O caçador de pipas”, lançado no Brasil em 2005, já vendeu 1,6 milhão de exemplares por aqui. “Cidade do sol”, outro livro do Khaled Hossein, já está nas estantes de 550 mil brasileiros.
8 de janeiro de 2008
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