31 de janeiro de 2008

Filhos eternos


Não é muito original dizer isso, mas não custa repetir que "O filho eterno", de Cristovão Tezza (Record), é um ótimo livro. E o melhor: conheço algumas pessoas que já o leram. Isso permite algo difícil nesses tempos: conversar, ainda que por e-mail, sobre um livro. Numa dessas conversas, um amigo me chamou a atenção para um dado interessante de "O filho eterno": no fundo, o personagem principal também busca o pai. No processo de rejeitação/aceitação do filho down, ele também se descobre filho, um filho igualmente eterno.
Essa observação permitiu - e a conversa foi seguindo - perceber o quanto o autor é hábil ao criar discretos paralelismos entre a história de seu filho e fatos de sua própria biografia. O filho tem uma deficiência que lhe causa óbvios problemas de adaptação ao mundo. Mas, ao refletir sobre o filho, o pai reconhece suas menos explícitas dificuldades. A humanização do personagem principal se dá de forma gradual. Algo só pode existir na medida em que ele também se descobre incapaz, inadaptado. A deficiência de um expõe a do outro. Uma leitura que nos ressalta o como, de alguma forma, somos todos meio (ou muito) incapazes e inadaptados. E é essa perspectiva que faz de "O filho eterno" um livro profundamente humano.

2 comentários:

Marcelo Moutinho disse...

É um belo livro, sem dúvida. E corajoso demais. Só me pergunto como será para o Felipe, o filho, ler aquelas páginas...

Fernando Molica disse...

Também pensei muito nisso. De acordo com o livro, o personagem Felipe não lê, mas isso não impede que alguém lhe conte passagens dolorosas. Como a história do o pai desejar a morte do filho down. É complicado - mas cabe ao autor/pai resolver. Importante: o livro é um romance, uma obra de ficção. Não é necessariamente a história do Tezza.